Carnaval e Prefeitura

 Carnaval e prefeitura


Fim de ano e Carnaval são duas épocas que famílias de cidades do interior recebem os parentes que moram fora. São filhos, primos, netos, sobrinhos e agregados que retornam às suas terrinhas natais para passar esses feriados, como geralmente viajo no fim de ano, é no carnaval que reencontro colegas de escola que estão residindo em outra localidade e sempre é a mesma conversa: ficamos relembrando nossos saudosos anos 80. 


Esse ano não foi diferente. Era no Clube ou no bloquinho que sai de frente da prefeitura que de abraço em abraço relembrava alguma história. 


Minha cabeça voltou várias décadas e fiquei relembrando de como aquela adolescente da década de 80 imaginaria que eu estaria hoje na casa de seus 50 e poucos anos. Sim, eu tenho mais de 50, na realidade 52, nasci em 1973. 


Acreditava que nesse idade, em que eu me encontro, estaria fazendo bodas de prata, formando um filho e casando a outra filha. Seria magra, alta, com cabelos grisalhos penteados em coque, usando meias de seda e escarpim da Czarina, uma marca de sapato que vendia na década de 80 e não existe mais, mas em vez disso eu ainda estava solteira, sem filhos e pulando atrás do trio elétrico, pois como diz a música, só não vai atrás do trio quem já morreu e eu ainda estou vivinha da Silva, diferente de muitas amigas que, mesmo vivas, estão mais enterradas em suas casas que muitos defuntos no cemitério.


E, entre muitos  “ala la la ooos” e “tira o pé do chão”, um dedo de prosa para matar saudades de tempos que só voltam em nossa memória. 


Um admirador secreto que resolveu se desmascarar em pleno carnaval encorajado por um pouquinho de álcool, dizendo que eu tinha sido a menina mais bonita da cidade. Que ironia, a menina mais bonita da cidade, pelo menos para meu admirador que agora não era mais secreto, tinha ficado solteira. 


Sorri, agradeci o elogio e, meu corpo continuou na coreografia atrás do trio, mas minha mente não estava ali, ela, como se fosse uma máquina do tempo, tinha retornado à minha adolescência. 


Em uma época onde as declarações de amor eram feitas em tinta spray no muro. Olhei para meu admirador que não era mais secreto, as iniciais de seu nome não coincidiam com as iniciais de outro admirador que havia escrito com tinta preta no muro branco da minha casa: “Ana Paula te amo. BG”. 


Eu nunca soube quem era BG e acho que nunca saberei. Os pais ficavam bravos, mas nós, as “julietas” das declarações pixadas em muros, segurávamos um troféu que comentávamos com orgulho nas rodinhas de conversa na hora do recreio no Colégio Anjo da Guarda.


Quantos amores soterrados pelo medo da decepção que preferiam cometer um crime - sim, pixação é crime, a convidar uma menina para tomar um sorvete na Sorveteria do Luiz no domingo à tarde. Sem contar que uma bola de sorvete de chocolate com cobertura de chocolate chamada “Moreninha” na casquinha de biju era mais barata que uma lata de tinta spray.


Acho que devia ter cara de brava, de mais brava que meu pai, afinal o GB teve coragem de pixar o muro da minha casa e nunca me chamou para um sorvete, mas o King Kong não tinha medo de mim.


King Kong, que a lembrança me veio à mente entre as inúmeras fantasias, algumas improvisadas que desfilavam na rua atrás do trio. 


Minha terra faz um calor que deixa qualquer forno industrial parecendo brinquedo de criança, e o calor nos meses de verão é ainda pior, pois, mesmo quando chove, em vez de refrescar, parece que sobe uma quentura do asfalto, como se colocasse uma frigideira quente em baixo da água fria, por isso as fantasias de carnaval, geralmente, são elaboraras para suportar as altas temperaturas tropicais. Exceto a do King Kong.


Era uma festa à fantasia no Clube, eu nem lembro do que estava vestida, quando um ser, vestido inteirinho de macaco de pelúcia começou a pular na minha frente. No começo achei até engraçado, pensei que era alguém contratado para animar a festa, afinal com o calor que estava fazendo, qualquer indivíduo normal só usaria aquela pelúcia toda se estivesse ganhando, e ganhando bem, mas depois de um tempo percebi que era apenas um admirador secreto fantasiado que queria me chamar atenção, pois por mais que eu tentasse evitar aquele mico, o King Kong continuava a me cercar, chegando a imitar a forma como eu dançava, até o momento que a brincadeira passou a incômodo e eu mudei de lugar, saindo de perto do amigo do Tarzan, que deve ter voltado pra Selva com outra Jane e eu nunca soube também quem era a pessoa que estava dando vida ao famoso macaco do Empire State.


E, entre pixações de muro, King Kongs, conhecidos, desconhecidos, médicos, advogados, desocupados e casados, um amigo político me chama para seu partido, o mesmo do Tarcísio, mas que é Tarcísio, pergunto eu, imaginando alguém de quem eu deveria lembrar da década de 80, onde minha cabeça ainda estava a relembrar os fatos e com uma resposta exclamada ele responde: “o governador do Estado!!!”, o que me traz de volta ao ano de 2025 e logo em seguida me remete ao futuro: será que Bebedouro um dia terá uma prefeita?   Mas isso é história para uma próxima eleição.


Obrigada se você leu até aqui!


Bj

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