Senta que lá vem história novamente
“Ana Paula, por que você parou de escrever?” Depois de perguntarem minha idade e do porquê eu não casei, essa é a pergunta que mais me fazem.
Eu não parei de escrever, apenas parei de publicar. Motivo? Inveja. Pode parecer bobagem, mas nunca sabemos a intenção das pessoas que nos seguem em nossas redes sociais.
Sabe aquela conhecida que vive perguntando onde você compra suas coisas. Afaste-se. Sabe aquela pessoa que vive bisbilhotando sobre sua vida. Afaste-se. Sabe a fulana que vive dando conselhos e nunca os segue. Afaste-se.
“Mas, Ana Paula, assim ficarei sozinha.” Sim, minha cara leitora, é melhor só que acompanhada de uma pessoa invejosa, se Abel soubesse disso teria se afastado de Caim; José não teria sido vendido pelo irmãos como escravo e Jesus não teria morrido crucificado, portanto não é um mero conselho meu, é Bíblico.
Mas, depois dessa singela introdução, pegue a pipoca pois o texto de hoje é grande e, senta, porque lá vem história novamente.
Eu e minha elegante mãe estávamos em um desses chás de caridade que as senhoras benevolentes da sociedade fazem para ajudar as entidades da cidade.
Esses chás são um verdadeiro desfile de moda, onde as mulheres da sociedade disputam, sem ganhar coisa alguma, nem uma mísera medalha, quem será a mais bem vestida do evento.
Vou fazer um parênteses:
Diferente dos homens, que ao longo de toda a vida, vão aos eventos sociais com um único terno e a mesma gravata, trocando apenas a camisa para esconder a gordura acumulada na barriga, a qual fica acima do coz da calça, que cada vez é colocada mais abaixo, haja vista não fechar mais no local certo ante o aumento da circunferência da cintura, as mulheres, a cada festa, necessitam emocionalmente de um traje novo e, muitas vezes, completamente diferente, dos anteriores.
Claro que existem mulheres que se vestem de forma clássica, como a saudosa rainha Elizabeth do Reino Unido, a qual só mudava a cor da roupa, mas a maioria de nós mulheres gostamos de seguir uma tendência chamada moda, e muitas vezes essa “tal de moda” não ficam bem em todos os tipos físicos.
Voltemos.
Minha elegante mãe era do tipo clássico, eu sou básica, mas toda família tem aquela que gosta de ser fashion.
Já estávamos sentadas em uma mesa próxima a um ventilador eu e minha mãe, quando a fashion da família chegou um tanto quanto atrasada, devido ao congestionamento no cabeleireiro de senhoras ávidas a consertar o que as intempéries do tempo haviam causados em suas faces com camadas de base que se assemelhavam a reboco em parede mal feita e cabelos endurecidos com laquê para não perderem a forma durante todo o chá.
A moça em questão estava muito elegante e bonita, pelo menos eu havia gostado da produção que a pessoa havia pagado em várias prestações no cartão de crédito apenas para passar calor em uma tarde de chá quente em uma região onde as têmpera altas são presença constante o ano todo.
Eu tinha gostado tanto da produção que resolvi comentar que quase havia comprado uma saia igual a dela, inclusive da mesma cor, mas por um simples detalhe de circunferência de meu quadril, nenhuma havia me servido.
A parente em questão, frisou que seria impossível eu ter gostado de tal saia a ponto de comprar uma igual, pois a referida vestimenta era exclusiva e só tinha uma de cada cor na loja onde havia comprado.
Mas eu não havia visto a “belíssima” saia na boutique que a elegante socialite havia mencionado, mas em um lojão, desses bem populares, chamado Explosão 10, onde qualquer peça custava apenas R$10,00.
Vou fazer um parênteses.
Eu, praticamente, vivo no centro da cidade, próximo ao calçadão das lojas populares, antes eu tinha loja em uma das travessas da rua do comércio (apelido do calçadão), depois que fechei a loja e me tornei advogada, meu trajeto obrigatório era por essa mesma rua, indo do fórum velho à Vara do Trabalho, passando pelos bancos e cartórios e, hoje, eu, literalmente, moro no centro, vizinha do calçadão, portanto as vitrines das lojas populares são minhas “paisagens” todos os dias e por isso eu sei onde vende roupas das boutiques a preços populares.
Voltemos.
Mal acabei de mencionar o nome da loja a qual tinha visto a referida saia, senti uma forte dor no meu ante braço, achei que poderia ser um infarto, mas era minha elegante (e agora saudosa) mãe apertando o referido membro para que eu fechasse a boca e não continuasse com meu espontâneo, porém indelicado, elogio.
Vou fazer um parênteses, novamente (o que seria das minhas histórias sem essas observações?):
Eu não sou o tipo de pessoa que dá indiretas, aquelas falas calculadas para alfinetar e incomodar o ouvinte, eu sou espontânea, filtro pouco a fala, e sempre escapa por meus lábios os meus pensamentos, por isso “dar fora” é algo comum em minha humilde existência.
E depois da indiscreta fala, tentar justificar o injustificável é no mínimo complicado e muitas vezes impossível, mas voltemos à história da saia de boutique que também era possível ser adquirido no Explosão 10, por um preço bem mais em conta.
A pessoa que estava com a saia perdeu o brilho, a festa acabou, de “se achando” passou a “se escondendo” em milésimo de segundo.
Respondeu-me que eu deveria estar enganada, que as saias poderiam ser “parecidas” e, eu novamente, com minha indiscreta espontaneidade respondi, segurando no tecido da barra: “tenho certeza que é a mesma saia”. Depois disso eu só fui sentir meu braço novamente em casa, devido ao segundo apertão da minha elegante (e agora saudosa) mãe no meu antebraço.
A moça da saia ficou sentada o chá inteirinho, não levantou nem para ir ao banheiro, puxou a toalha da mesa sobre as pernas para esconder a saia, podia chegar quem fosse, a criatura não levantava para cumprimentar ninguém.
O incômodo era grande. E a raiva acho que também crescia, não de mim, mas da boutique onde ela havia comprado a saia.
Tentei melhorar a situação constrangedora que havia feito, disse que naquele chá, naquele ambiente de alta sociedade, a saia dela seria uma peça exclusiva, diferente se ela estivesse em algum Risca Faca, onde, com certeza, todas senhoritas teriam uma igual, talvez em cores diferentes.
Minha elegante (e agora saudosa) mãe ao escutar aquilo, deu outro apertão no meu braço, mas dessa vez eu nem senti, pois ainda estava “anestesiado” pelo segundo apertão.
E a cada apertão, minha mãe dizia algumas frases soltas, mas sempre sorrindo e sem alterar a voz, mais parecia que estava fazendo um elogio, mas na realidade ela estava dizendo: “Ana Paula, você está tão desagradável, minha filha” ou então era um “melhora, Ana Paula.”
Para você, querido leitor, entender melhor o tom de voz da minha mãe: troque a palavra “desagradável” da frase acima, por “linda”, assim entenderá como é dar uma “dura” de forma elegante.
Voltemos.
Eu acho que também ficaria com raiva por causa da saia, não por ter outras iguais, mas por ter pagado bem mais caro.
O chá seguiu seu roteiro de sempre: bingo, discurso das voluntárias, sorteio de brindes das lojas do comércio… e nada da moça levantar.
Já tinham sorteado o brinde final, que geralmente é uma joia ou uma viagem, as pessoas já estavam levantando com os arranjos que enfeitavam as mesas na mão para irem embora, algumas mesas já estavam vazias e os garçons começavam a tirar as toalhas e dobrar, algumas cadeiras já estavam empilhadas… e a moça continuava sentada escondendo a referida saia com a toalha da mesa.
A maioria das senhoras já haviam ido embora, só restavam as voluntárias fazendo o fechamento e experimentando a comida de fim de festa, o buffet já tinha guardado quase todos utensílios e móveis, exceto nossa mesa, onde ainda estávamos sentadas.
Achei que a moça fosse pedir a toalha do buffet emprestado para ir embora escondendo a saia, mas, por uma logística, enquanto as voluntárias estavam na porta de entrada, nossa heroína, aproveitou de um segundo de distração, fingiu que foi até o banheiro e saiu sorrateiramente, com sua nada exclusiva saia, pela porta dos fundos.
Parênteses: não sei como a cozinheira do buffet não disse para a moça, enquanto passava pela cozinha para ir embora, que tinha uma saia igual a dela? Voltemos.
A moça nem dormiu de raiva. Mentalizou a noite toda cada palavra que iria dizer no dia seguinte na boutique onde havia comprado a referida saia.
Mal o comércio abriu, nossa heroína, levantou, se arrumou, não colocou a saia (acho que nunca mais a vi com tal vestimenta), entrou no carro e foi, primeiro no lojão popular onde a saia custava “deizão”. Olhou a mercadoria, comparou com a que havia comprado na boutique e que estava dentro de uma sacola, virou do avesso, viu que eram da mesma fábrica, pois marca de roupa popular é igual raça de cachorro vira-lata: indefinida.
Dirigiu-se ao caixa da loja popular com a vestimenta em uma das mãos, uma nota de dez reais na outra, a bolsa à tiracolo e uma sacola no antebraço com a saia da boutique que era da mesma cor da qual estava pagando.
Vou fazer outro parênteses:
Eu teria comprado de cores diferentes, assim teria mais opção para usar.
Voltando.
Com a prova em mãos, ou seja, a saia que havia acabado de comprar e uma nota fiscal comprovando a origem da compra e o valor, nossa heroína da saia, se dirigiu até a boutique onde havia comprado a primeira saia.
Entrou na boutique, cumprimentou a vendedora e pediu para chamar a proprietária. A princípio a dona do estabelecimento acreditou que a saia devia ter apresentado algum defeito e até propôs em dar outra em troca, mas de outra cor, pois eram peças “exclusivas”, mas o defeito da saia, era justamente a saia.
Pensei que a dona da boutique fosse utilizar a teoria da Coca Cola, ou seja, você paga a mesma coca cola no mercado R$5,00; no restaurante R$10,00 e no aeroporto R$15,00, ou seja, dependendo do lugar seu produto tem um valor, mas não, ela foi mais inteligente.
Explicou que a saia era a mesma (não tinha como negar), mas o valor cobrado a mais era a produção da roupa, pois se nossa heroína tivesse comprado a saia na loja popular, ela teria que procurar uma blusa para combinar em outro lugar, pois não teria no lojão de Dez Reais.
Ao passo, que na referida boutique, a proprietária já havia feito esse serviço de montar o look, e isso justificava o valor a maior da saia, que havia sido valorizada, não apenas pelo ambiente, mas também pelo “acompanhamento”.
Quando selecionamos as pessoas com as quais andamos, também elevamos quem somos, como a saia de R$10,00 que por estar junto de roupas caras em uma boutique teve seu preço aumentado, pois não é só o ambiente que frequentamos que nos define, mas as pessoas com quem convivemos também.
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